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Multipoesia

Multipoesia – um nome provisório enquanto surge um novo

versão 1: 1998

A Videopoesia, ou poesia ‘para ser vista na tela’ surgiu praticamente junto com o surgimento do cinema, nas experimentações com a nova linguagem. Depois, com o surgimento do vídeo ela teve novo impulso. Com a computação gráfica voltada para produção de vinhetas e animações eletrônicas para vídeo, que se estabeleceu fortemente na década de 80, abriu-se ainda mais o espaço para a palavra em movimento, associada ou não a áudio.

Foi quando comecei a fazer poemas em movimento, usando computação gráfica nos primórdios dessa arte digital, quando um pc xt animava grosseiramente palavras serrilhadas na tela. Depois, ao longo dos anos 90, assisti à explosão da mídia digital, com o surgimento do CD ROM, dos conceitos de multimídia, hipertexto e finalmente a conectividade global com a internet. Nesse período continuei trabalhando com literatura, mas trabalhei muito na produção de informação em suporte digital. Foram dezenas de obras em CD ROM e internet, além de experimentações com video interativo e sistemas públicos de informação cultural.

A partir da minha vivência nessa área, percebi que o termo Videopoesia ainda deixava dúvidas em relação ao suporte da poesia em movimento, se no computador ou no suporte video-filme. Evidentemente que ambas opções de suporte possuem semelhanças e uma distância em relação ao papel. A incorporação do movimento, textura, horizontalidade da área de representação, sincronia com áudio, etc, são algumas dessas semelhanças. Mas há também diferenças entre a forma/conceito dos trabalhos realizados em um ou outro suporte, que vêm aumentando à medida que o tempo passa.

O poema agora tem movimento e tempo; e o poema é muito além, tem múltiplas formas de interação com o usuário, muitas direções a seguir no seu movimento. Ele segue impresso, móvel, visual, sonoro… Mas ele é pleno para se representar numa nova dimensão de exploração. E é para ela que precisamos de uma palavra. Para ressaltar essas novas possibilidades, esse conjunto maior que surgiu e engloba também a Videopoesia.

Multipoesia foi o nome mais entendível nesse momento para guardar por algum tempo o significado dessa nova forma de expressão e comunicação artística que abole as fronteiras que já eram tênues entre diversas formas de arte, as fronteiras entre criador e leitor, as fronteiras entre idiomas, estilos, etc. Multipoesia para representar a poesia em suporte computacional multimídia, ou melhor, a criação-apropriação literária em suporte digital multisensorial e interativo. A poiesis na comunicação digital.

Este nome, entretanto, não tem toda a minha preferência. Eu encontro resistências em aceitá-lo, por que ele ainda se apoia na percepção do antes. Por que ‘multi’ mostra bem que ainda não se percebeu a unicidade de sentidos que a multimídia bem produzida pode trazer. E ‘poesia’ é algo que está ficando difícil de sustentar diante das inúmeras interações com questões visuais e musicais que o novo ambiente propicia. Na verdade estamos vendo uma quebra de fronteiras tradicionais na arte.

Querendo ou não sempre estivemos presos a um suporte para ‘ler’ algo. Sejam os auto-falantes, sejam folhas de papel ou telas. Sempre precisamos de um aparato tecnológico: entalhadeira, caneta, máquina, computador. Precisamos de alguma técnica que reproduza nossa ‘fala’ e possa chegar ao leitor. De tempos em tempos, uma técnica surge e muda-se o suporte. Agora, as características do suporte circundam um novo eixo. O Multipoema é uma forma de linguagem inscrita em bits, programadada num software para executar operações multisensoriais de entrada e saida de informações.

O poema pulsa, comunica-se através de vários meios sensoriais, se refaz ao acaso, ao avesso, explora combinações sintaxicas novas, rumos aleatórios. No texto-no-software guardamos além de conceitos e sintaxe predefinida, novos elementos, tais como a distribuição espaco-temporal de elementos, as possiblidades de reordenamento sintático, de comunicação com o o leitor e de sua interferência. Surge também o conceito de versão, como nos softwares, que começam um dia e estão em permanente mudança depois, na medida em que surgem implementações, novas formas, possibilidades, avanços tecnológicos, etc. As obras nunca estarão acabadas depois de publicadas e isso é uma mudança substancial.

O Multipoema é sem dúvidas um avanço no conceito de Videopoesia, já que ele pode estar ou não na tela. Pode ter áudio ou não, pode ser fechado ou aberto. Na verdade o Multipoema é uma experiência de poiesis que usa uma comunicação via entrada-saída sensorial digitalizada e se estrutura em uma base de dados com sintaxe que incorpora características de software. Esta estrutura permite uma sintaxe mutante baseada em linguagens de programação que se adiciona aos elementos sensoriais da obra. Permite, entre outras coisas, a interferência permanente do criador e do ‘leitor na obra, categorias estas que estão passando também por profundas modificações, tendendo a desaparecer.

Pretendo explorar neste sítio estas novas perpectivas, inicialmente com experiências introdutórias em diversos pontos de intersecção: visual-interativo, visual-sonoro, sonoro-interativo, linear-deslinear ordenado e aleatório. Teremos a limitação da linguagem Java e do espaço de comunicação apertada dos navegadores, mas ganharemos amplidão no acesso de leitores. Ao longo do ano estarei produzindo peças também em CD ROM, onde poderemos explorar mais os elementos de ‘banda larga’, tais como vídeo, áudio e telas em alta resolução. Este texto, para não fugir ao novo cenário, estará em permanente mudança. Incorporando a experiência que só o tempo nos trará. Por isso pode mudar de versão com o tempo.

* Para conhecer alguns multipoemas basta ir à seção Multipoesia. Se você deseja conhecer mais sobre estes novos campos de arte, leia também: Videopoesia (1994).

Álvaro Andrade Garcia

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